Só para não perder o bonde, algumas impressões pontuais sobre a disputa envolvendo os clubes brasileiros, a CBF e a TV Globo.
O Clube dos 13 (na verdade formado por 20 equipes) divulgou hoje, sexta-feira, o resultado da licitação/concorrência para transmissão dos jogos dos Campeonatos Brasileiros de 2012-2014. A única emissora a apresentar proposta (516 milhões de reais por ano) foi a Rede TV, "vencedora" portanto do processo. A surpresa do dia ficou por conta da Record que, em comunicado oficial, anunciou na última hora que desistia de participar do processo. Lamentavelmente, deve agora procurar cada clube, abrindo leilão no varejo.
A Globo já estava fora. Há muito se sabia que não encaminharia qualquer proposta. Julga-se acima do bem e do mal. Defende o capitalismo sem disputa. Sem ameaças. Sem concorrência livre. E sem riscos. A truculência autoritária da vênus platinada para tentar manter o monopólio da verdade no futebol é asquerosa. Esperta, seduziu primeiro Corinthians e Flamengo, os dois times de maior torcida (e mercado e renda e visibilidade e vendas...) do país. Rachou o grupo. Atraiu outros grandes (Fluminense, Vasco, Botafogo, Santos, Grêmio, Cruzeiro...), sabe-se lá com que promessas e acenos, pois vale lembrar que os bastidores de "negociações" não chegam ao grande público, perdem-se em "segredos", são considerados informações sigilosas.
Pois como torcedor desde sempre do Santos Futebol Clube e sócio da agremiação há mais de 30 anos, gostaria muito de saber o que levou o presidente Luis Álvaro Ribeiro a decidir negociar individualmente com a Globo, ignorando o Clube dos 13. Quais as vantagens para o Santos, presidente? Por que essa preferência? Se futebol é negócio, os valores financeiros alcançados não seriam bem mais interessantes se os clubes fizessem valer a força do coletivo?
No blog do jornalista Paulo Vinicius Coelho, um exemplo concreto desses valores: "o Coritiba já sabe quanto a TV Globo oferece pelos direitos de transmissão de seus jogos nos Campeonatos Brasileiros entre 2012 e 2014. Segundo o presidente Jair Cirino, a emissora acena com R$ 27 milhões anuais. Atualmente, o Coritiba recebe R$ 13 milhões, mas passaria a receber R$ 34,8 milhões pelo valor mínimo da licitação promovida pelo Clube dos Treze". Aceitar a oferta da Globo significa topar receber cerca de oito milhões de reais a menos por ano, se compararmos com a perspectiva indicada pelo Clube dos 13. Quantia considerável para qualquer clube, não?
Condenável também o recuo intempestivo e inesperado da Record, que fomentou expectativas (falsas, ilusórias, sabemos agora) para no frigir dos ovos seguir o péssimo exemplo da Globo. O episódio talvez sirva apenas para confirmar que, nessa saga, fica cada vez mais difícil encontrar abnegados benfeitores. Para ser mais preciso e correto: nessa história toda não há santos.
Falemos pois da toda-poderosa CBF. Ricardo Teixeira? Bem, dispensa comentários. Age como dono do espetáculo, como a dizer "o futebol brasileiro sou eu". E não há quem tenha coragem de dizer que o rei está nu, que caducou no poder, que seu reinado é nefasto para o futebol brasileiro. Ao contrário. Os clubes continuam a bajular e a fazer afagos e carinhos no rei. Por quê?
Falemos pois da toda-poderosa CBF. Ricardo Teixeira? Bem, dispensa comentários. Age como dono do espetáculo, como a dizer "o futebol brasileiro sou eu". E não há quem tenha coragem de dizer que o rei está nu, que caducou no poder, que seu reinado é nefasto para o futebol brasileiro. Ao contrário. Os clubes continuam a bajular e a fazer afagos e carinhos no rei. Por quê?
A postura dos clubes, aliás, deve ser duramente condenada. Flamengo, Corinthians e todos os outros dissidentes (são 12, no total) não formalizaram a saída do Clube dos 13. Por quê? Para rachar de fato e de direito, teriam antes de saldar dívidas astronômicas. Não têm esse dinheiro. Ao mesmo tempo, viram as costas para a entidade e, no balcão de negócios, tentam acertar "individualmente" os valores de transmissão. Colocam os pés em duas canoas. Situação cômoda, não?
Mas, se não oficializam o racha com o Clube dos 13, continuam sendo representados por ele, certo? É o que diz explicitamente o estatuto da entidade: "Pelo presente estatuto, os associados autorizam a entidade a negociar de modo coletivo e previamente, com terceiros, os direitos individuais a eles pertencentes, especificados na legislação vigente". Para todos os efeitos legais e jurídicos, os dissidentes continuam sendo associados. Pois então... O que a Justiça tem a nos dizer?
O cenário é tão caótico e absurdo que o pobre torcedor, como diria Nelson Rodrigues, corre sério risco de ter de acompanhar os jogos dos "times da Record", as partidas das "equipes da Globo" e, agora, quem sabe também os embates entre os "acertados com a Rede TV". A primeira não poderia transmitir jogos de "contratados" da segunda, que não poderia mostrar jogos da terceira, que por sua vez estaria impedida de passar jogos da primeira e assim por diante, criando um círculo de bloqueios. Teríamos, de fato, dois (ou três?) campeonatos sendo exibidos. Que bagunça! E ainda quem sabe a prerrogativa da toda-poderosa do Jardim Botânico de apontar o dedo e decidir a tabela do campeonato, minando a concorrência, como revela o blog do Perrone.
Como escreveu o jornalista Rodrigo Vianna, "o futebol é algo tão sério para o brasileiro que o governo federal deveria intervir nessa história. Intervir, não: “arbitrar”. Já que a concorrência não vale, deixemos o Estado cuidar disso. Não digo que precisemos imitar a Argentina, com jogos transmitidos pela TV pública. Mas que tal a TV pública brasileira entrar na disputa, montar um pacote razoável de horários, e depois vender cada horário para uma emissora privada? Seria o fim do monopólio. E o fim dos espertalhões. Mas quem acredita nisso…".
Os clubes brasileiros tinham a chance de começar a reduzir a abissal distância que separa o nosso futebol do profissionalismo que caracteriza esse esporte na Europa. Estão jogando essa oportunidade histórica na lata do lixo. Para continuar sustentando o monopólio global - e os desmandos do rei.
Não é que os times perderam a chance de mudar. Eles nunca quiseram mudar. O grande nó aqui é que você avalia o capitalismo como um acordo de nobre ingleses civilizados, quando - ainda mais nesse setor - trata-se da selvageria pura. É guerra de foice pelo lucro, numa demonstração de primitivismo do capital. E há um terceiro fator que também não ajuda (o que desmonta a ideia dos seguidores de Canclini e Barbero): o público topa a parada e brinca com as regras que lhe são impostas. Aí como faz?
ResponderExcluirO pior de tudo, para mim, é ver o Luis Alvaro, cujo discurso é de moralidade e decência e que acabou de fazer um golaço com a aprovação do novo estatuto do clube, andar de braços dados com Ricardo Teixeira, Andres Sanchez, etc., sabe-se lá por qual motivo. Que ele tenha a dignidade de explicar aos santistas o que efetivamente está por trás disso. Já não chega a muito mal explicada TEISA e a venda de parte do Neymar, Arouca, Rafael, etc?
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