quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O CONSERVADORISMO PAULISTANO ABRAÇOU RUSSOMANNO

Depois de uma manhã com gosto amargo e de sonhar que deixava a cidade por quem sempre fui apaixonado, estava aqui almoçando e conversando com Elisa Marconi, compartilhando agonias e jogando ideias ao vento, tentando entender e decifrar o enigma Celso Russomanno. 

Considerando o que tem acontecido na cidade nos últimos tempos (incêndios em favelas, especulação imobiliária, rampas contra moradores de rua, proibições infinitas, racismo, suásticas pintadas em muros de escolas, vociferações contra nordestinos, para citar apenas alguns exemplos asquerosos), olhando para os mapas das pesquisas eleitorais e considerando análises de intelectuais como Marilena Chauí, Vladimir Safatle e Boris Fausto (além de um texto fundamental da jornalista Eliane Brum - "Russomanno e a vulgaridade do desejo"), é possível, em linhas gerais e lamentavelmente, constatar que São Paulo decidiu abraçar de forma inexorável, mergulhar de cabeça mesmo, sem pudores e com convicção, na construção e realização de um projeto reacionário de cidade. 

Mas o conservadorismo que sustenta Russomanno não é bloco absoluto, homogêneo, de matriz ou raiz única. Num primeiro nível, trata-se do histórico desejo de "ordem e segurança" da tradicional classe média excludente paulistana, a elite branca desde sempre autoritária e anti-petista (embora o PT atualmente esteja muito longe de representar qualquer ameaça ao estado das coisas), mas que se desencantou com a figura (o sujeito, o indivíduo, o político) José Serra e que respira aliviada por poder recorrer e pedir socorro a um "novo" xerife. Não ficará órfã. Por essa razão, o candidato do PRB vai bem nas pesquisas em tradicionais redutos tucanos, como Pinheiros, Perdizes, Jardins, Higienópolis, Casa Verde e Vila Maria. 

Em outro movimento, não menos importante, nota-se atração e encanto explícitos por Russomanno daquela que vem sendo chamada de nova classe média. São atores sociais que foram beneficiados pelas políticas sociais colocadas em prática no Brasil nos últimos dez anos, filhos diretos do lulismo, e para quem a razão de ser da existência humana passou a ser a capacidade de compra, sem necessariamente realizar a máxima iluminista que diz que a cidadania plena só pode ser exercida por meio da garantia e da manifestação cotidiana dos direitos humanos. Desejam ardentemente ter, sem necessariamente vislumbrar a perspectiva de ser - até porque, de acordo com a lógica e o discurso político que abriram espaço para tal ascensão (sempre o lulismo), ter significa ser. 

Dispostos a não perder o que conquistaram, apostam em alguém que avaliam ser capaz de garantir o consumo dos serviços e de outros atrativos que a cidade possa oferecer. Aqui, vem à tona com força a figura do defensor do consumidor. Quem melhor do que Celso Russomanno para cumprir essa papel, nesse momento? Essa variante ajuda a entender a invasão e o estouro de votos do candidato no PRB nas franjas e nas periferias da capital paulista, sendo também o preferido de eleitores de bairros como Guaianases, São Mateus, Cidade Tiradentes, Grajaú e Parelheiros, umbilicalmente ligados até aqui a candidaturas do PT.

Como se vê, por razões diferentes, as aspirações das duas classes se encontram, como revela a lucidez de Eliane Brum no texto citado, quando a jornalista escreve: "Para além das diferenças, que são muitas, há algo que tem igualado a socialite que faz compras no Shopping Cidade Jardim, um dos mais luxuosos de São Paulo, ao jovem das periferias paulistanas carentes de serviços públicos de qualidade. E o que é? A identificação como consumidor, acima de todas as maneiras de olhar para si mesmo – e para o outro. É para consumir que boa parte da população não só de São Paulo quanto do Brasil urbano tem conduzido o movimento da vida – e se consumido neste movimento". 

Por vias tortas, parece que o ex-presidente Lula será mesmo ator político fundamental e decisivo na definição do futuro prefeito de São Paulo - no entanto, talvez o escolhido da população não seja o abençoado pelo líder petista.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

VEJA, PERGUNTAR NÃO OFENDE...




A revista (Panfleto? Tampa de esgoto?) Veja diz que tem a gravação da entrevista com Marcos Valério ("matéria" de capa da edição que está nas bancas) botando a boca no trombone e acusando o ex-presidente Lula de ser o chefe do "mensalão", mas avisa que decidiu não divulgar o áudio para respeitar acordo feito com a fonte. 

Singelas dúvidas: 

1) Por que raios então a revista escreveu e reconheceu inicialmente, no editorial ("Carta ao Leitor") da mesma edição, que a tal entrevista não aconteceu e que foram ouvidos amigos e "interlocutores próximos" a Marcos Valério?; 

2) Por que Marcelo Leonardo, advogado de Marcos Valério, veio imediatamente a público para reforçar e garantir que a revista jamais conversou com o cliente dele, sem que a publicação da Abril movesse um músculo para contestar a afirmação?; 

3) Se essa gravação existe, por que não foi ainda encaminhada para a Justiça, para que os devidos procedimentos de investigação sejam adotados? A Veja tem prerrogativas de Ministério Público?; 

4) Se Veja tivesse mesmo esse tiro de AR-15 contra Lula, por quem alimenta ódio de classe desde sempre, trancaria o troféu a sete chaves ou correria para espalhar a gravação por todos os canais e meios possíveis e imagináveis, fazendo um "estardalhaço final"? Não seria a tão desejada "bala de prata"? E fica guardada?;

5) Veja guardaria esse tesouro em plena campanha eleitoral (disputas municipais)?;

6) Desde quando a revista se comporta de forma ética, a ponto de honrar e respeitar acordos feitos com as fontes?

7) Por fim, por que diabos o governo federal continua sustentando esse panfleto (só o governo Dilma investiu cerca de 1,5 milhão de reais na Editora Abril, em inserções publicitárias)?

Só para saber. Perguntar não ofende. 

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

EM TEMPOS DE PROTOFASCISMO, UMA MENSAGEM DE ESPERANÇA


O texto abaixo foi escrito pelo poeta Thiago de Mello (nascido no Amazonas, perseguido pela ditadura militar e exilado no Chile, onde tornou-se amigo de Pablo Neruda), numa ocasião em que trocou e-mails com uma muito querida e guerreira amiga minha, também jornalista. Conversavam os dois sobre versos e pensamentos poéticos - e o que o poeta fez foi presenteá-la com reflexões sensíveis e profundamente tocantes sobre a beleza da vida e os encantos da existência humana. Com a devida autorização, decidi compartilhar essa maravilha com os leitores do Blog. Porque, em tempos tão duros de protofascismos, manos, chacinas, rampas contra mendigos, proibições infinitas, Pinheirinhos, higienes sociais, "quem não reagiu está vivo" e quetais, é preciso - fundamental - respirar esperança, para sentir a alma pulsar novamente. Muito obrigado, Thiago!

"Para começar, acho que a vida do homem neste lindo lugar tão maltratado chamado Terra, nossa morada, está  ficando cada dia mais complicada, mais difícil. Simplesmente viver já é uma aventura arriscada e mal sucedida, para milhões de seres humanos, só neste país marcado pelo abismo infame entre poderosos que têm tudo e querem ter cada vez mais e a legião de miseráveis que mal conhecem o cheiro do pão de cada dia.  A sobrevivência honrada, digna da beleza da condição humana, é esmagada pela injustiça, pela desavergonhada corrupção. E a convivência, que é, afinal, o que dá verdadeiro sentido à existência humana? Cada dia mais complexa, mais difícil. O homem se transforma cada dia mais num animal que tem medo do homem. Que desconfia dele. A pessoa amedrontada fica agressiva. O homem e a sociedade.
A indiferença sufoca a solidariedade. O respeito ao semelhante deu lugar à fúria do individualismo, que é, sim, uma forma de violência. Tanto quanto a fome.
Dentro desta realidade social, onde você vê a vida simples? A vida não é simples nem para a Natureza tão bondosa, que vive para ser útil à vida dos animais, inclusive ao seu filho mais ilustre, o homem. Sei o que estou dizendo, porque consagro muito de mim, com a minha palavra e a minha vida, pela preservação da floresta amazônica, o mais precioso patrimônio de vida, o maior parque genético do planeta, cada dia mais perigosamente ameaçado pela cobiça internacional e indiferença dos governantes e falta de consciência do brasileiro.
E no entanto, pois lhe digo com toda a naturalidade, faz tempo, entre o apocalipse e a utopia, optei pela utopia. Acho que é possível, sim, a construção de uma sociedade humana solidária. Vai demorar, vai ser preciso educação e consciência, de que cada um pode  fazer a sua parte para mudar o que deve ser mudado. Apesar de todas as ferocidades do nosso tempo que se abatem contra a esperança da vida que o ser humano merece. 
A grande crise que mancha a vida humana é a falta de esperança, é o desamor. A indiferença pela dor alheia. A mentira que degrada a palavra.
De minha parte, sigo fiel ao que escrevo: "Aqui tenho a minha vida, pronta para ser usada. Vida que não se guarda, e nem se esquiva assustada. Para servir ao que vale a pena e o preço do amor." 
Thiago

terça-feira, 11 de setembro de 2012

PARA ENTENDER RUSSOMANNO, É PRECISO OUVIR MARILENA CHAUÍ

Fonte - www.romulogondim.com.br


Quando a subida nas pesquisas do candidato defensor do consumidor já se anunciava como um fenômeno não passageiro na disputa pela Prefeitura de São Paulo, registrei aqui algumas hipóteses para tentar compreender esse movimento. 

Em minha leitura, há certamente uma parcela dessas intenções que se manifesta por conta do "recall", da lembrança próxima, da visibilidade do postulante. Russomanno foi candidato a governador de São Paulo em 2010 - e alcançou votação representativa (terceiro colocado, mais de um milhão de votos), quase ajudando a levar a disputa a segundo turno. Até o final de junho, apresentava o quadro "Patrulha do Consumidor", na TV Record, com audiência bastante razoável e cativa. Sabe usar os meios de comunicação. Coloquei à mesa também para reflexão o fato de São Paulo ser uma cidade historicamente conservadora, que passou por adhemarismo, janismo, malufismo e tucanismo-kassabismo, mas que já não mais suporta José Serra (42% de rejeição), fortemente identificado com o prefeito Gilberto Kassab (PSD), que é por sua vez pessimamente avaliado pela população (nota 4,4, de acordo com o Datafolha, numa escala de zero a dez). Assim, minha impressão é que uma boa parte desses votos conservadores estaria escorregando para a candidatura Russomanno, o "fato novo" a ser sustentado (são votos que não migrariam para o PT). 

Some-se a isso o fato de o candidato aparecer como uma espécie de xerife, o garantidor da ordem e dos bons costumes paulistanos (discursinho que sempre funciona em São Paulo), além de ter respaldo e sustentação declarados da Igreja Universal do Reino de Deus e de outras correntes evangélicas, o que pode ajudar a explicar os índices significativos de votos conquistados até aqui nas periferias da cidade, em áreas historicamente fieis ao PT, como a zona leste paulistana. 

Essa tentativa de compreender o fenômeno Russomanno passa obrigatoriamente pela fala da filósofa Marilena Chauí, no evento "A ascensão conservadora em São Paulo", promovido pelo Coletivo dos Estudantes em Defesa da Educação Pública e realizado no final de agosto na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo (USP). Não tive a oportunidade de participar do debate, infelizmente, mas resgatei o vídeo que circulou freneticamente pelas redes sociais e vi algumas vezes a intervenção de Marilena, que não tergiversou e foi na jugular: "São Paulo é uma cidade protofascista. Esse sentimento está interiorizado na sociedade paulistana. A gente nem percebe mais", afirmou.

Com um misto de ironia e de indignação, ela recordou acontecimento emblemático dessa visão de mundo paulistana - retrógrada e egoísta. Num domingo recente, a professora precisava tirar dinheiro em caixa eletrônico em banco próximo da casa dela, mas as três vagas do estacionamento estavam ocupadas por um único veículo - um carro prateado gigantesco, com vidros escurecidos. Ela entrou no banco reclamando e dizendo que aquela atitude não estava correta. Segundos depois, foi abordada por uma mulher "naturalmente produzida" que, aos berros, perguntava para Marilena, sem constrangimento algum: "você não tem educação? Vai gritando com qualquer um, mesmo com quem não conhece? E você quer que eu estacione meu Mercedes em qualquer lugar?".

Marilena confessou que foi tomada por uma onda de raiva quase incontrolável. E respondeu: "você é legítimo paradigma da classe média paulistana autoritária e violenta. Você é uma abominação política". A senhorita, sem entender muita coisa, quase partiu para as vias de fato. Marilena replicou: "Você é uma abominação ética". A toda-produzida e poderosa não se fez de rogada e, tal qual birra de criança, e então ajudada pelo namorado ou marido, fulminou: "a senhora é uma velha feia!". Marilena fechou o cerco: "transformar minha velhice em xingamento é uma abominação cognitiva". A dona do carrão continuou sem entender muita coisa. 

(Breve nota - quem lida cotidianamente com a umbiguista terra de ninguém da entrada e saída de crianças em escolas particulares de São Paulo, com os carrões de última geração a mandar no espaço público e no trânsito, com cada motorista resolvendo o seu problema e dane-se o resto, identifica-se de imediato com a narrativa da professora).

Assim, o episódio com a dona do Mercedes no banco é simbólico do cenário político paulistano. "Convivemos com isso corriqueiramente. Viajo pelo Brasil. E não vejo algo que se aproxime de São Paulo, nesse sentido. É violência extrema. Está instalada historicamente e reforçada pela situação atual da cidade", explica a filósofa. Para ela, em seu conjunto, a sociedade paulistana é autoritária, verticalizada, marcada pela presença das oligarquias, que naturalizam as desigualdades, operando com preconceitos de classe, religiosos, de sexo, profissional e racial. "É uma sociedade que não reconhece a humanidade do outro", alerta. "Quando recebe impulso das políticas neoliberais, funciona como a mão e a luva - a cidade alarga os espaços privados, numa super exposição de intimidades, e estreita e espaço público. Pior: o privado é sempre superior, passa a ordenar e regular o público", completa.

É nessa toada que funciona a sociedade paulistana, segundo Marilena, que traduz esse modus operandi em uma ideologia - a da ética. Aqui, ela faz um alerta: trata-se de uma ética desvirtuada, com viés empresarial, utilitarista, a estabelecer os padrões de conduta dos empregados, aquela que vai controlar e fiscalizar todos os comportamentos, numa espécie de entidade onipresente e repressora, e que acaba por transformar a cidade no espaço do "não pode, tudo é proibido, tudo deve ser denunciado, asséptico e limpo". Segundo Marilena, os paulistanos ignoram a verdadeira ética, aquela que se relaciona intimamente com o exercício da consciência, da liberdade e da responsabilidade.

Falando especificamente sobre a classe média paulistana, Marilena destaca que se trata de um segmento historicamente conservador. "Esteve na Marcha da Família, rezava terço contra o comunismo, sustentou o Comando de Caça aos Comunistas e apoiou a ditadura militar", lembrou. Foi, portanto, sustentáculo ideológico fundamental do regime de terror instalado no Brasil em 1964. E foi recompensada, de acordo com a filósofa, com a massificação do ensino superior, para realizar "a aspiração máxima da classe média, que é o diploma, não o conhecimento, o saber". 

Marilena foi mais uma vez precisa: como não tem o poder político (nas mãos das elites), nem o poder econômico e social (que pertence aos trabalhadores), a classe média se apresenta como protagonista do exercício do poder ideológico. Nesse sentido, o núcleo de seu pensamento é o desejo de ordem e segurança, considerados imperativos fundamentais desse projeto. "Ela tem pesadelos com a simples possibilidade de se proletarizar, de cair de nível e de virar trabalhadora". Por essa razão, Marilena diz que os programas sociais e de distribuição de renda viabilizados no Brasil nos últimos anos balançaram os alicerces da classe média paulistana, que está em pânico. "Sente que seu espaço foi invadido, vê-se completamente ameaçada. É como se o mundo dela estivesse desabando".

A corrida para o candidato-gerente conservador e defensor dos bons costumes e da tradição passa a fazer sentido... Representaria um suspiro aliviado dos desesperados, sempre na direção da ordem e da segurança.

Por fim, no mesmo debate, as intervenções do filósofo Vladimir Safatle são também para lá de relevantes para esse esforço de compreensão e de análise política. Ele falou sobre as novas classes médias conservadoras, "filhas bastardas do lulismo", e ressaltou o fato de terem sido forjadas a partir da referência do consumo, e não da cidadania. Engrossariam, assim, esse caldo de cultura conservadora, embora por outras motivações. Prometo postar aqui em breve o resumo da fala dele.

--------------
Aqui, o link para o vídeo com a íntegra da fala de Marilena Chauí - 

terça-feira, 4 de setembro de 2012

DEZ PERGUNTAS SOBRE OS INCÊNDIOS EM FAVELAS DE SP

Fonte - spnoticias.com.br

Mais um incêndio atingiu ontem mais uma favela da cidade de São Paulo - desta feita, as vítimas foram os moradores da Favela do Piolho, no bairro do Campo Belo, na zona sul da capital, numa área que fica próxima, bem pertinho mesmo do aeroporto de Congonhas, imponentemente encravado em região nobre da metrópole. Em 2012, foi o trigésimo segundo incêndio dessa natureza em São Paulo (média de quatro por mês); já tinham sido registrados outros 79, no ano passado. Só ontem, quase 300 casas foram destruídas e mais de mil pessoas ficaram desabrigadas. Não tenho, confesso, condições de fazer afirmações. Mas, como sugeria e ensinava o filósofo grego Sócrates, ao reconhecer que "só sei que nada sei", posso fazer perguntas. Questionar não ofende. E ajuda a pensar. Minhas dúvidas:

1) Será que a Prefeitura de São Paulo nos considera mesmo tolinhos e imagina que vamos acreditar, num exercício de fé profunda, que os incêndios são apenas coincidências, lamentáveis tragédias?

2) Incêndios em favelas nessa quantidade acontecem em alguma outra cidade do planeta? Ou São Paulo é um foco isolado, um ponto fora da curva, uma "metrópole incendiária exclusiva"?

3) Será que apenas os moradores de favelas não sabem acender o gás ou riscar um fósforo, não sabem lidar com o fogo?

4) Por que essa mesma quantidade de incêndios não acontece em condomínios de luxo dos bairros nobres da cidade?

5) Por que a Prefeitura paulistana, à época da administração de José Serra, desativou o Programa de Segurança contra Incêndio, implantado durante a gestão da prefeita Marta Suplicy e que tinha como propósito justamente desenvolver ações de prevenção e orientação especificamente em favelas? E por que o atual prefeito, Gilberto Kassab, não retomou o programa?

6) Por que os bombeiros e as demais autoridades públicas responsáveis pelas investigações não conseguem explicar ou definir as causas e os responsáveis pelos incêndios, com os laudos finais invariavelmente apontando para "motivos indeterminados"?

7) Será que o que de fato move esses incêndios é uma deliberada política de higienização e limpeza social, destinada a expulsar os moradores das favelas, que "enfeiam as paisagens", para aproveitar os terrenos finalmente "limpos" para a especulação imobiliária, tornando assim a fotografia da capital "mais bela e atraente"?

8) Por que nenhum jornal de referência e de grande circulação faz as perguntas que devem ser feitas, com intuito de construir a melhor versão possível da realidade?

9) Por que os repórteres de emissoras de rádio e de TV que transmitem informações ao vivo sobre os incêndios (incluindo os repórteres aéreos) parecem sempre mais preocupados com os reflexos dos incêndios sobre o trânsito, em apontar rotas alternativas para os motoristas, do que em dedicar atenção às vítimas das tragédias (muitas fatais) ou à destruição de casas e de sonhos?

10) Por que nos acostumamos aos incêndios nas favelas e passamos a considerá-los algo "natural, normal", como se já fizessem parte da paisagem urbana e do cotidiano da metrópole, aceitando resignadamente a banalização da tragédia e da violência? Em que lugar do passado ficou perdida nossa capacidade de indignação e de reação?