quinta-feira, 23 de junho de 2011

SOY LOCO POR TRI, AMÉRICA




Eu cresci usando o manto branco sagrado com duas estrelas douradas estampadas, altura do peito, lado esquerdo, acima do escudo. Tinha (e tenho) muito orgulho delas. Mas desdenhavam, faziam chacotas e diziam que aquilo não valia, porque eu nem era nascido quando as conquistas que justificavam aquelas duas estrelas tinham sido alcançadas. 

Eu cresci torcendo entusiasmadamente para o esquadrão que teve a honra de ser a equipe a abrigar o maior camisa 10 da história do futebol, o melhor de todos os tempos, o gênio incomparável, o Rei do futebol, o craque com mais de mil gols. Mas diziam que também não valia, porque eu jamais tinha visto uma jogada, um gol sequer de Pelé (a não ser, claro, em jogos gravados, arquivos de emissoras). Me chamavam de "viúva do Pelé". 

Cresci - e foram longos os anos difíceis de vacas magras - torcendo sem arredar pé e apaixonadamente por um clube que encantou o mundo, que mostrou como o futebol jogado como arte pode ser também eficiente e vencedor, que parou guerras, que deixou boquiabertos brasileiros, italianos, espanhóis, sul-africanos, argelinos, costa-riquenhos, argentinos, uruguaios... Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe. Era fácil recitar a escalação. Mas diziam que, mais uma vez, não valia, porque eu também não tinha visto estes craques desfilarem em campo. Enfim, era como se valessem apenas o imediato e o aqui e agora, como se só a História que a gente viu tivesse valor e pudesse ser contada e valorizada.  

Mas foi então que eu comecei a ver. Vi a primeira geração de Meninos da Vila, com Pita e Juari. Vi Serginho Chulapa bater na bola de canela e carimbar o Paulistão de 1984. Vi Giovani fazer tremer o Pacaembu e o título brasileiro de 1995 bater na trave - ou melhor, no apito do árbitro Marcio Rezende de Freitas. Vi Robinho chamar a responsabilidade e pedalar sete vezes diante de um Rogério atônito e aparvalhado. Foi quando veio o título brasileiro de 2002 - e as faixas das torcidas, até aquele dia de ponta cabeça, foram viradas. 

Fui até São José do Rio Preto, interior paulista, mais de 400 quilômetros de estrada, mais de nove horas de viagem (ida e volta) para ver de perto a oitava taça de Campeonato Brasileiro ser erguida. Vi o esquadrão alvinegro praiano abocanhar mais quatro títulos paulistas - aliás, em uma dessas finais, a de 2010, vi um Ganso já genial, craque maduro que sabe o que faz, dedo em riste, a bater no peito e dizer para o técnico: "não vou sair", garantindo a conquista de um time valente, que jogava com dois a menos. Vi o primeiro gol de um (mais ainda) franzino Neymar, que nem cabelo moicano ainda usava, no Pacaembu, num 3 x 0 contra o Mogi Mirim, em março de 2009. Vi um inesquecível 9 x 1 contra o Ituano. Vi o maestro Ganso reger a orquestra afinada e pródiga em goleadas na Copa do Brasil do ano passado, quando também contamos com a volta de Robinho, fundamental naquela conquista. Vi o primeiro gol do Arouca com a camisa do Peixe, contra o Corinthians, na última final paulista.

E ontem eu vi.... o Pacaembu lotado em festa, um mar branco a cantar, o bandeirão a ocupar toda a arquibancada, a esperança tensa e ao mesmo tempo confiante na chegada da terceira estrela. Vi Rafael, sempre seguro, quase não precisar pegar na bola. Vi Danilo fazer um golaço, um tapa de canhota com curva na redonda, a morrer no pé da trave direita do goleiro uruguaio. Vi Edu Dracena e Durval ganharem todas de cabeça e anularem o tímido ataque de camisas amarelas e pretas (liga não, xerife Durval, o gol contra foi mero acaso). Vi Leo, santista de alma e de coração, ser aplaudido de pé. Vi Adriano, limitado tecnicamente, correr o campo todo, um guerreiro incansável na marcação. Vi Arouca, peito estufado, bola grudada no pé, romper sem dó nem medo a defesa adversária, passar por cinco uruguaios e abrir caminho para a vitória, como que a dizer: "faz, Neymar". Vi Elano, ainda longe de sua melhor forma,  quase fazer um golaço de falta. Vi Zé Love perder gols, como de costume, mas participar talvez da melhor partida dele no ano. Vi o Ganso, genial, absoluto dono do meio de campo, cadenciar a partida, com toques sutis e repentinos, assistências milimétricas a encontrar companheiros sempre mais bem colocados - e aquele passe de letra no primeiro gol é realmente coisa para poucos iluminados boleiros. Vi Neymar decidir mais uma vez, com um gol de chapa, batida rápida, curta e seca na bola, que saiu traiçoeira e manhosa, fez ligeira curva e foi morrer no fundo da rede. Neymar foi feito provavelmente em forma de outro mundo, onde deve se jogar um futebol de outra dimensão. Não há como pará-lo. Ontem, eu vi um time jogando coletivamente, de forma inteligente, com raça, de forma coesa, sem cair na catimba uruguaia, combinando técnica e vontade imensa de ganhar.

Amigos secadores, eu vi o Rei Pelé correr pelo gramado de mãos dadas com o mago e vencedor Muricy Ramalho, um obstinado campeão (quem foi mesmo que disse que ele era ruim de mata-mata?). E vi finalmente a Taça Libertadores da América ser levantada pelo capitão Edu Dracena. Vou ver em breve essa taça no Memorial das Conquistas. Vou ver o Mundial de clubes, no final do ano (dezembro, Japão). E outra Libertadores, no ano mágico do centenário (2012). Santástico!

Carrego agora três estrelas no peito. E posso, com muito orgulho e com muito amor, falar com detalhes sobre a História de cada uma delas, de todas elas, as não vistas - e a que vi ser alcançada. Todas merecem respeito. Admiração. Reverência. São parte de um passado e de um presente só de glórias.

Porque nascer, viver e no Santos morrer é um orgulho que nem todos podem ter.

Soy loco por tri, América. 

Um comentário:

  1. Chiquilito, meu irmão querido, de sangue, de coração, de alma, de sofrimentos, de alegrias. Estivemos juntos em todos esses momentos. Sofremos com os Tuícos, Arizinhos, Camilos. Choramos nos 5x2 contra o Fluminense, choramos com o assalto da semana seguinte, choramos com as oito pedaladas (tínhamos que encerrar o jejum em cima deles...)e vimos a terceira estrela escorregar pelas mãos em 2003. Tudo bem. Entre 2003 e 22 de junho de 2011, recuperamos a hegemonia estadual (alguém tem dúvida?), patinamos em alguns poucos anos e, para desespero do chamado "Trio de Ferro", colocamos em evidência a terceira geração dos Meninos da Vila. Se a de 78 ganhou "só" o Paulista e a de 2002 "só" dois brasileiros, essa ganhou, em 2 anos, 2 estaduais, a Copa do Brasil e nos deu a tão sonhada terceira estrela. E não só: para desgraça dos rivais, a terceira geração dos Meninos da Vila nos trouxe "só" Neymar e Ganso. Craques, gênios, mitos. Eu vi. Eu vi Neymar e Ganso. E eu vi Arouca, eu vi Danilo, eu vi o MONSTRO Leo, eu vi o gigante Adriano, eu vi o xerife Durval, eu vi a muralha Rafael, eu vi o predestinado Elano (faltou o seu golzinho ontem), eu vi o capitão Dracena, eu vi o cabeçudo Zé Love. Eu vi até o Pará, que, ao contrário do Corinthians, é campeão da Libertadores. E eu vi Muriçoca, eu vi LAOR (o presidente de clube mais sortudo da história do futebol mundial). Eu vi o Rei Pelé, chorando feito o menino de 17 anos ganhando a Copa de 58. E, eu vi o mar branco no Pacaembú, lindo, inesquecível. Eu vi...e chorei. Chorei abraçado a você, meu irmão. Sim, nós somos campeões da América. E, para os prepotentes e arrogantes de plantão que jamais perdem a empáfia: na América, a supremacia já era. No mundo, ela pode durar só até dezembro. Porque, NASCER, VIVER E NO SANTOS MORRER É UM ORGULHO QUE NEM TODOS PODEM TER.

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