Há muito ainda o que entender a respeito do golpe de Estado no Paraguai - e essa tarefa certamente não será cumprida se continuarmos recorrendo aos discursos e textos produzidos por Mervals, Azevedos, Jabores e quetais, que não escondem os sorrisos de contentamento e se apressam apenas em comemorar a queda de mais um presidente "esquerdista" na América Latina. É preciso romper esse cinturão reacionário - e, nesse sentido, as redes sociais e os blogs mais uma vez têm tarefa relevante (embora não suficiente) a cumprir. Para contribuir modestamente com esse movimento, recomendo uma leitura apurada e cuidadosa do documento acusatório apresentado pela oposição ao Congresso Nacional do país vizinho, que elenca as "justificativas" para a deposição de Fernando Lugo. No texto, são evidentes as digitais de rapina dos grandes fazendeiros paraguaios, a desenhar e pavimentar o golpe. Eis uma das chaves para compreender o processo anti-democrático: Lugo inverteu prioridades e contrariou interesses de gente graúda. E bateu de frente com os circuitos privilegiados do poder.
Diz um trecho emblemático do texto que "foi o governo do presidente Lugo o responsável exclusivo por instigar e facilitar as recentes invasões de terras na região de Ñacunday. A falta de respostas por parte das forças policiais diante das invasões dos sem-terra que não respeitam a propriedade representa apenas parcela desse comportamento cúmplice. O presidente Lugo tem usado as forças militares para gerar um verdadeiro estado de pânico em toda a região, violando os direitos de propriedade. (...) E embora essas invasões se espalhassem por outros departamentos da República, Lugo se mostrava sempre com as portas abertas para líderes dessas invasões, dando mensagem clara à cidadania de seu apoio a esses atos de violência e aos delitos patrocinados por essas organizações. (...) Lugo submeteu as forças policiais aos interesses dos 'carperos' (sem-terra), que têm patrocinado todo tipo de abuso e agressão à propriedade privada".
Chamo a atenção para a quantidade de vezes que se faz referência, de uma forma ou de outra, em pouco mais de dez linhas, "às invasões de sem-terra e às violações da propriedade privada". A repetição não é casual - ao tentar equacionar uma gravíssima chaga social vivida pelo Paraguai e colocar em marcha iniciativas de reforma agrária e de distribuição de terras, Lugo, que governava sem maioria no Congresso, deu a senha para que os fazendeiros colocassem o golpe em marcha. A roda reacionária já estava girando havia algum tempo. A morte de onze trabalhadores rurais e de seis policiais em uma reintegração de posse acontecida no último dia 15 de junho, em Curuguaty, distante 250 quilômetros da capital, fechou o cerco e colocou o presidente definitivamente na berlinda. A tragédia foi exaustivamente reverberada pela mídia oposicionista, a consolidar o clima de pânico e o discurso do "não há liderança, o país está acéfalo". Foi o suficiente para que os fazendeiros, em conluio com deputados e senadores oposicionistas, entrassem com o pedido de impeachment no Congresso, alegando "mau desempenho das funções" e jogando nas costas de Lugo a responsabilidade pelas mortes.
O resto do roteiro - um jogo de cartas marcadas - já é conhecido: na quinta-feira, 21 de junho, a Câmara dos Deputados aprovou o pedido de abertura de impeachment; no dia seguinte, início da tarde, o Senado começou a julgar a solicitação. Lugo teve cerca de duas horas para apresentar sua defesa. Ao final da tarde, já tinha sido apeado do poder, e não era mais o presidente do Paraguai. Às oito da noite, o vice-presidente Federico Franco (que faz jus ao sobrenome), que já tinha cerrado fileiras com a oposição, tomou posse como novo mandatário máximo do país. Tudo isso durou cerca de 30 horas. "Não havia base suficiente para montar um processo de impeachment. O julgamento foi um fuzilamento sumário", registrou Clóvis Rossi, uma das poucas vozes midiáticas lúcidas até aqui, na Folha de São Paulo.
Sem eufemismos: o que aconteceu no Paraguai foi um golpe de Estado.
Satisfeitíssimos com a nova realidade política, os latifundiários paraguaios, coordenados pela União de Grêmios de Produção (UGP), não tiveram o menor pudor ou constrangimento em simplesmente anunciar o cancelamento do tratoraço que estava marcado para a próxima segunda-feira, com objetivo de protestar contra a política agrária do governo Lugo. Sem esconder a felicidade, e ameaçadores, os fazendeiros mandam ainda recado aos líderes dos países que rechaçam o golpe: "os de fora não devem tentar interferir nos problemas internos do Paraguai".
"Originalmente escrito para outros dois artigos a ver com este."
ResponderExcluirAmanhecer com um artigo de Tarso Genro no Blog do Altamiro Borges e mais o artigo de Mauro Santayana e este, é um chamado, ainda, que, para um soldado solitário como eu, repetindo, solitário, ainda, pois aguardo de minha de tempos remotos, casa, o chamado. Pois morrer pela pátria ou viver sem razão é sentido, mas viver sem razão quando nos traem em pátria, como se pátria traíssse e não traída, aí pátria deixa de ser razão, como o viver.
Em outros comentários e até artigos que arrisquei, em meu semi-analfabetismo, escrever sobre o mensalão "da tentativa de golpe de estado" no Brasil e que só não aconteceu porque o Supremo Tribunal Federal e principalmente Gilmar Mendes se não me engano ainda procurador Geral da União, ou que fosse já como ministro, juntos, acordaram a tempo e impediram o impeachiment de Lula. Porque até a maioria dos petistas já haviam caído no conto do vigário do mensalão e ameaçavam se rebelar contra o governo.
Hoje, aLguns petistas, desavisados ou influênciados por uma pequena parcela de petistas bloguistas, principalmente, que conscientemente por razões meramente pessoais, alteram os rumos desta história por outras intrigas com Gilmar Mendes. Ficam indignados e levam outros a tanto quando deixo comentário dizendo que o PT lhe deve gratidão eterna, como à todo o Supremo Tribunal Federal. E deveria agradeço-los com honrarias em nome da pátria, porque sustentaram corajosamente a democracia. Pois a rasteira havia sido dada e sorrateiramente rápida, e caso alguém não ficasse de pé logo como o STF e Gilmar Mendes, a derrubada do governo era certeira, estaria concretizada.
Tarso Genro conta-nos duas histórias em uma, Fernando Lugo e Lula vem de um mesmo movimento. Mexer com uma elite intocável desde séculos pela primeira vez. Não se venderam e não se venderão, por isso esteve, no caso do Lula, e estará no caso de Fernando Lugo, em risco de sofrer um golpe de estado o tempo todo.
Está na hora de aproveitar o ensejo, porque estamos em plena pressão para votar o mensalão o mais breve possível, apressadamente, para criar mais um pandemônio político no país e diminuir a força do Lula. Também, aos petistas como Tarso Genro no mesmo ensejo, humildemente deve dar início ao processo de reconhecimento e agradecimento oficializado ao STF e a Gilmar Mendes pelo impedimento do golpe de estado no Brasil com o mensalão, e o fortalecimento e garantida da democracia.
Também não cabe a você, Tarso Genro, político de sua envergadura, se manter ocupado só com os problemas do Rio Grande do Sul. Esta aqui um exemplo prático do que falo, a falta de mais, para somar, manifestações coerentes e verídicas sobre temas como o golpe de estado no Paraguay, por um político de sua consciência e importância.
José da Mota.