sábado, 25 de maio de 2013

O SANTOS DEVERIA TER SEGURADO NEYMAR

Não faço parte de comitês gestores. Não sou executivo, tampouco empresário. Não uso terno e gravata. Não tenho canetas para assinar (ou romper) contratos. Mas algumas contas elementares eu (acho) consigo fazer. E o fato incontestável é que, nas últimas quase cinco temporadas do nosso futebol, Neymar da Silva Santos Jr. garantiu ao Santos e aos santistas abundância de ganhos tangíveis e intangíveis - expressão que os marqueteiros e os diretores de clube adoram usar.

O menino-craque nos brindou com seis títulos - o tri Paulista, a Copa do Brasil, a Recopa Sul Americana e a Libertadores. Ficamos ainda com um vice mundial, fazendo reaparecer nossa marca e nosso escudo no cenário internacional. Voltamos a ser protagonistas, a receber holofotes e a ser novamente observados e respeitados pelo mundo da bola. Durante dois anos (2010-11), fomos o esquadrão a ser batido por aqui. Resgatamos o orgulho de ver em campo alguém que atuava por prazer, com ousadia e alegria, a honrar a cada instante e em todas as partidas a camisa do clube. Um craque. Foi o melhor que vi jogar, artista dono de repertório infinito de dribles e de toques refinados e desconcertantes, raciocínios rapidíssimos, lances de bailarino ou malabarista. Vestindo o manto sagrado, Neymar ganhou o Prêmio Puskas de gol mais bonito de 2011, oferecido pela FIFA. Foi finalista da mesma disputa no ano passado. Foi o único boleiro das Américas a ser incluído, por dois anos seguidos, na lista dos melhores do mundo da entidade máxima do futebol.

O moleque prodígio disputou 229 partidas pelo Santos. Marcou 138 gols. É o maior artilheiro do time depois da era Pelé, o décimo terceiro da história da nossa fantástica fábrica de gols. Arrematou prêmios atrás de prêmios - revelação, destaque, artilheiro, melhor do certame. Ganhou duas Bolas de Prata, outra de Ouro, um título de hors concours ("fora da disputa"), honraria até então exclusivamente oferecida ao Rei do Futebol, em eleições organizadas pela ESPN/Revista Placar. Por onde passou, Neymar mobilizou multidões de fãs, encheu os estádios de torcedores e de admiradores. Se o Brasil tem alguma chance de levantar o sexto título de Copa do Mundo no ano que vem, essa mínima possibilidade passa diretamente pelos pés do menino santista.

Os números são oficiais, conhecidos publicamente. Em 2009, o Santos tinha 19 mil sócios - atualmente, somos 65 mil, dos quais quase 52 mil pagam rigorosamente em dia suas mensalidades (importante fonte de arrecadação). Somos o quarto clube do Brasil com maior número de sócios adimplentes, atrás apenas de Internacional (82 mil), Grêmio (72 mil) e Corinthians (muito pouco na nossa frente, com 53 mil). No Estado, nadamos de braçada e superamos por gigantescas margens Palmeiras (24 mil) e São Paulo (20 mil). Muito por conta de Neymar (ou será que foi graças à bela barba do Laor?), a torcida do Santos cresceu e rejuvenesceu - conheço vários pais que, torcedores de outros clubes, se desesperam vendo seus filhos abraçando o alvinegro da Vila.

Em patrocínios de camisa, arrecadamos seis milhões de reais em 2009 - e 35 milhões de reais em 2012. O faturamento total do clube saltou de 70 milhões para 198 milhões, no mesmo período citado. Em 2011, nossos cofres receberam 25 milhões de reais com cotas de transmissão de TV, valor que triplicou e alcançou 75 milhões no ano passado - estamos no mesmíssimo patamar de São Paulo, Palmeiras e Vasco e abaixo apenas e tão somente de Corinthians e Flamengo, que tiveram cotas de 84 milhões cada. A marca Santos está hoje avaliada, segundo consultorias da área, em 380 milhões de reais (é a sexta do ranking nacional). 

Manter Neymar foi mesmo um péssimo negócio para o Santos. Só tivemos prejuízos. Era preciso mesmo vendê-lo - ou melhor, quase doá-lo. Ação entre amigos. Da negociação (algo próximo de 75 milhões de reais), o Santos deve abocanhar cerca de 40 milhões. Lucas foi vendido, no ano passado, por 108 milhões de reais. O Chelsea pagou 78 milhões por Oscar. O Zenit da Rússia investiu 150 milhões de reais no passe de Hulk. Para ter Thiago Silva, o Paris Saint Germain pagou 125 milhões ao Milan. A diretoria do Santos fez uma baita negócio. Eu é que não sei fazer contas. O Barcelona agradece.

Ironias deixadas de lado, e como já vimos, havia várias razões de "mercado" para lutar com muito mais afinco e carinho pela permanência de Neymar no Santos até o final do contrato, em julho de 2014 (que, aliás, quando foi renovado, em novembro de 2011, foi cantado em verso e prosa pelo mandatário santista como uma revolução no nosso futebol, a iniciar novos tempos, que deixariam para trás a 'colônia exportadora de craques'. Pois bem, esse documento inovador foi literalmente rasgado e jogado na lata do lixo). Se o camisa 11 tivesse ficado, o departamento de marketing do Santos que se virasse e mostrasse competência para viabilizar novas estratégias e ações para transformar o último ano dele por aqui em novos retornos financeiros para o clube. Será que os nossos doutos marqueteiros sabem que Neymar é o atleta com maior potencial de mercado do planeta? O jogador que o Santos 'vendeu' por 40 milhões de reais.

Para além dos euros, dos dólares, dos reais, confesso, tinha mais um motivo para defender Neymar no Santos até a Copa do Mundo. Era uma razão quase filosófica. Penso que teria sido fundamental mostrar, ainda que pontualmente, uma vezinha só, que o futebol ainda guarda resquícios de um esporte apaixonante, para além das ditaduras do negócio, e que os clubes entendem que, mais do que os ativos bancários, é preciso preservar e privilegiar os craques que dão espetáculo, que tratam a bola com carinho. 

Claro, podem começar a jogar pedras, é a visão de um romântico, ingênuo, anacrônico e sonhador. Por um tempo, tolamente, imaginei que a diretoria do Santos seria minha parceira nessa utopia. Fui traído. Era preciso fechar as contas, fazer dinheiro (da forma mais simplista e imediatista). O mundo é mesmo dos cifrões. E foi assim que Neymar se foi.

3 comentários:

  1. Suas palavras resumrm o sentimento de toda naçao alvinegra praiana... hoje pode-se dizer que estamos de luto.

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  2. Traídos. Fomos traídos. Não tenho mais o que dizer.

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  3. Mas quando o jogador quer ir... não tem jeito.

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