3 DE JULHO - TRILHA SONORA PARA A VÉSPERA DA DECISÃO
Viver numa cidade
bucólica e sossegada como São Paulo é poder acordar preguiçosamente, ritmo de férias, bem
devagar, ouvindo sinfonia afinada de sabiás e o vento batendo de leve nas copas
das árvores. #SQN. Sete da matina. Pulo da cama com um barulho insuportável
feito por bate-estaca, ferro contra ferro, entrando pela janela do quarto.
Mais um mega empreendimento imobiliário que está subindo aqui no bairro. Derrubaram cinco casas no quarteirão. Comecei então e logo cedinho a matutar o texto de hoje. O que temos para essa
quinta-feira também sem bola rolando na Copa? Escrever esses relatos tem sido
uma experiência danada de instigante, aprendizado contínuo. Penso num tema, não
vale, não rende, troco, jogo fora, ideias vão surgindo e sumindo, brotando aos borbotões,
corta, edita, anota, não esquece, pesquisa, concentra, pode ser sobre aquilo outro também.
Até que finalmente bato o martelo. Invariavelmente, o que é publicado não
guarda qualquer relação com o arremedo de escrita do início do processo. Nessa viagem narrativa,
tempo (ou texto) final é necessariamente diferente do tempo (texto) inicial. É
a Física Literária. A FLIC - Física Literária que Inspira o Chico. Interdisciplinaridade. O Ministério da Educação vai ficar feliz. Pois a inspiração de hoje veio de um post da querida
Lisandra de Moura no face. Escreveu ela que "penso nesse nosso
jeito de criticar tanto, tanto e mais um tanto. De querer perfeição. Porque se
é frio, não tem amor à camisa e só pensa em grana. Se ganha, não vale porque
não jogou bonito. Se marca muitos gols, é porque o adversário era fraco. Não vi argentino reclamando do 1 a 0 contra o Irã e estou
aprendendo muito com os ticos da firma, que estão lá, sempre, com maior
otimismo e sem complexo de vira lata". Querem saber? Ela está coberta de razão. Somos
uns ranzinzas. Reclamões. Eu sou reclamão nato, de carteirinha e cadeira cativa. 100%
corneteiro. Instigado por ela, desatei num rápido exercício de auto-crítica.
Minha suspeita é que fomos acometidos por grave enfermidade. Somos filhotes e
prisioneiros da Síndrome Adversativa da F(a)olha de São Paulo. Explico o diagnóstico: o
jornal dos Frias, sobretudo quando trata do governo federal, tem sempre um
"mas" a impor. Emprego cresce, mas... Inflação está sob controle,
mas... Dilma cresce na pesquisa Datafolha, mas... Transportamos essa patologia
quase crônica para a relação que estabelecemos com a Seleção Brasileira. O time
de 82 era mágico, mas parou na eficiência tática da Itália. O do Parreira em 94 foi tetra, mas
dependia do Bebeto e do Romário. Seleção de 2002, 100% Jardim Irene, garantiu o
penta, mas foi favorecida pela arbitragem contra a Turquia e a Bélgica. Em
2006, formamos o quarteto fantástico, mas eram incorrigíveis baladeiros que não
honraram a camisa. Quatro anos depois, o Dunga resgatou o orgulho de atuar com
a amarelinha, mas exagerou na dose e formou quase um exército, legião romana.
Essa de 2014, de novo do Felipão, tem excelentes jogadores e um craque, mas é
muito jovem, não aguenta pressão. E os moleques choram! Sinceramente, já deu essa conversinha de jogadores
brasileiros com problemas emocionais. Psicologês quase de botequim. Emissoras de TV e de rádio, jornais e
portais só falam nisso. A questão de fato é: precisam treinar. Se tivermos
saída de bola, meio de campo e troca de passes, podem chorar os 90 minutos. Não me importo. Vixi, olha eu aqui resmungando de novo. Mas, porém, contudo, entretanto,
todavia, não obstante. Há sempre uma ressalva, invariavelmente depreciativa,
pejorativa. Detona tudo. Entramos numas de cobrar perfeição idealizada, aquela que não
existe no mundo nosso de cada dia. Nada está bom. Não fizemos por merecer. Negativismo
permanente, incapaz de reconhecer também virtudes, alegrias, melhoras. Nuances. Como se
essa Síndrome da Adversativa Folhesca fosse expressão máxima de consciência
crítica. Apartidarismo. Não pachequismo. De rabo preso com o leitor. #SQN. O
mundo complexo já não cabe mais (aliás, nunca coube) nessa caixinha do tem
isso, mas aquilo... São tantos os poréns. São tantas as emoções. Entre o preto
e o branco, há pelo menos cinquenta tons de cinza. A doença é grave. Mas tem
cura. A primeira providência clínica, receitada por cem em cada cem médicos
especialistas e pós-graduados em enfermidades da informação, é tirar a F(a)olha
do pedestal da infalibilidade. Desmonta. Baliza. Desconfia. Sempre. Nos embalos futebolísticos da Lisandra, decidi fazer diferente.
Experimentar outro caminho. Não vou reclamar. É véspera de decisão, de
quarta-de-final de Copa do Mundo. Palavras motivacionais. Chico Bicudo Scolari,
o motivador. Cumpro tal tarefa sugerindo aos boleiros da Seleção trilha sonora
para essa quinta-feira tensa. Música alimenta, anima, empolga, diverte, joga para
cima. Espanta males. Toca a alma. Julio César, Thiago Silva, David Luiz,
Paulinho, Oscar, Neymar, Fred e demais membros da família Felipão... ouçam por favor essas canções indicadas. No saguão
do hotel, no refeitório, nos quartos, no ônibus a caminho do estádio, no
vestiário, até na bica do túnel para entrar em campo. Comecem com "Pais e
Filhos", do Legião Urbana. Quero
colo. Vou fugir de casa. Posso dormir aqui com
vocês? Estou com medo, tive um
pesadelo. Só vou voltar depois das três.
Porque todos nós, seres humanos normais, carne e osso, temos medos e pesadelos.
Precisamos de colo. Catarse. Podem continuar com a poesia de Renato Russo. "Tempo
Perdido". Todos os dias
quando acordo, não tenho mais o
tempo que passou. Mas tenho muito
tempo. Temos todo o tempo do mundo. O
tempo da Seleção é amanhã. Noventa minutos. Sem sofrimento, por favor. Tem ainda uma
canção que foi hino de uma geração e deve tocar hoje também. "Pra não
dizer que não falei das flores". Geraldo Vandré. Vem vamos embora, que
esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer. Sonhos e
utopias. Sim, nós podemos. Ousar lutar, ousar vencer. O Ivan Lins faz parte
desse time. "Desesperar jamais". Afinal de contas, não tem cabimento,
entregar o jogo no primeiro tempo. Nada de correr da raia. Nada de morrer na praia. Até porque nossas traves, já sabemos, estão
abençoadas e protegidas pelos deuses do futebol. Sobe o tom. Sobe o som. Tira o
pé do chão. Vai rolar a festa. Deixa a vida nos levar. Alegria e ousadia. Chegou a hora
dessa gente bronzeada mostrar seu valor. Brasil,
esquentai vossos pandeiros, iluminai os
terreiros que nós queremos sambar. "Brasil Pandeiro". Novos Baianos.
Amanhã é dia de sambar com a bola no pé. Ginga e aplicação. Roda de samba no Castelão. Ajuda aí, camarada
Gonzaguinha. Puxa o coro. A gente quer valer o nosso amor. A gente quer valer nosso suor. A gente quer valer o nosso humor. A gente quer do bom e do melhor. A gente quer carinho e atenção. A gente quer calor no coração. A gente quer suar, mas de prazer. A gente quer é ter muita saúde. A gente quer viver a liberdade. A gente quer viver felicidade. "É!". Até porque não
estamos com a bunda na janela para colombiano passar a mão nela, certo? Podem
fechar a seleta com o mestre. Chico Buarque é obrigatório. Para Mané, para Didi, para Mané, Mané para Didi, para Mané,
para Didi, para Pagão, para Pelé e Canhoteiro. "O Futebol". Com sua
permissão, querido xará, hoje podemos cantar para Paulinho, para Neymar, para
Paulinho, Paulinho para Neymar, para Paulinho, para Neymar, para Oscar, para
Neymar e Fred. Terminou? Rodem de novo. E de novo. Mais uma vez. Sem parar. E aí, caros leitores? Alguma outra sugestão musical para compor esse set list? Do Himalaia, os deuses do futebol mandam avisar que a ata das quartas de final já foi discutida, redigida, assinada e devidamente registrada em cartório divino. O documento foi cuidadosamente guardado no fundo de um pote de barro, com areia por cima, e enterrado numa das cavernas da montanha. Só será divulgado no sábado à noite. Tentei jogar um verde, apurar. Só uma dica, pedi aos deuses. Quase implorei. Usei aquela tática que a gente utiliza com pai e mãe quando é criança, para descobrir os presentes de natal, 'só eu vou saber, não vou contar para ninguém, vai, conta...". #SQN. As entidades são honestíssimas. Oniscientes, onipresentes e onipotentes. Não deram pista alguma. Sigilo absoluto. Até para evitar jogatinas e casas de apostas. Bolões. Que nervoso. Vai, Brasil!
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