quarta-feira, 29 de julho de 2015

FUTEBOL SEM BASE

Os times nossos de futebol estão fazendo malabarismos com tochas nos semáforos, cantando vestidos como Elvis ou Michael na Paulista, passando a gravata cortada na noite do casamento, estourando de longe cheques especiais, segurando firme as moedinhas e qualquer trocado que conseguem, cordas bem apertadinhas nos pescoços, a sofrer com penúrias financeiras que são o resultado de administrações patéticas, amadoras e irresponsáveis. Draga de dar inveja ao Brasil dos anos 1990, quando éramos o aluno aplicado do FMI, aquele que fazia todas as lições de casa ditadas pelo mestre.
Precisam fazer caixa. Todos. Bola da vez - o São Paulo. Emparedado (o presidente do clube reconheceu em entrevista ao Estadão que a dívida chega a 270 milhões de reais), o tricolor abriu liquidação e desmontou o time que começou jogando o Brasileirão. Hoje, oportunidade única, imperdível, foi a vez do meia Boschilia, 19 anos, dizer 'fui'. Quase quarenta milhões de reais. O clube fica com metade. Boa grana, ninguém nega. Dá para respirar, pagar um fornecedor aqui, uns direitos de imagens acolá, evitar processos trabalhistas. Até começar a estourar o cartão de crédito de novo.
Vá lá, entendo. Mas fico aqui, sempre crica de plantão, anacrônico, idoso, romântico de Cuba, torcendo nariz para esse futebol negócio e esse semi-deus chamado mercado, a pensar que os jovens jogadores, a base, são o último alento e suspiro que nos restam, se almejamos mesmo algum dia resgatar aquilo que o nosso ludopédio já representou, se queremos voltar de fato a poder disputar hegemonia boleira planetária, com magia e eficiência, arte e competência. E a molecada está indo embora daqui cada vez mais cedo.
Quantas partidas inteiras Boschilia jogou pelo São Paulo? Não é craque (aliás, quem é o craque do Brasileirão mesmo?). Teve, no entanto, atuações bastante razoáveis pela Seleção sub-20 que disputou o Mundial da categoria, recentemente. Talvez virasse bom jogador. Não deu tempo. Zarpou. Mercado. Lucro.
Não é estranho que o mesmo São Paulo tenha segurado Luis Fabiano, pretendido pelo Cruz Azul do México? Óbvio, não seria a bolada que o Mônaco agora paga pela jovem promessa tricolor, nem poderia, mas seria um dindim a tirar poeira dos cofres do clube. No final do ano, LF sairá de graça. Nadica de nada de retorno. Nem títulos. Zero absoluto. Alguém explica?
Para que não fique parecendo picuinha clubística - quando vendeu Neymar, a preço de banana, operação esquisitíssima (para ser benevolente) investigada aqui e na Espanha, o Santos garantiu ao Barcelona a preferência de compra de três garotos da base, recebendo por fora mais alguns milhões de euros. Confesso que desconhecia esse tipo de negócio. O Corinthians já foi nove vezes campeão da Taça São Paulo sub-20. Quantos moleques que triunfaram nessas jornadas fizeram sucesso também no time principal? Marquinhos, zagueiro, é destaque do PSG. Para exorcizar fantasmas da série B, o Palmeiras montou dois times novos para 2015, vinte e tantas contratações. Moleques da casa? Gabriel Jesus e João Pedro, salvo lapso de memória. Pouco. Bem pouco,
Às avessas, corremos para repatriar medalhões em condições técnicas e físicas bem questionáveis, alguns já em fim de carreira, salários estratosfericamente milionários. Consequência? As dívidas viram conto de terror de Edgar Allan Poe. Para saldá-las, despachamos a molecada para outros mercados.
Será que é tão difícil perceber que esse modelo e essa filosofia não podem dar certo?
Vai ver estou delirando.

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